“Com toda a intensidade do debate internacional sobre os méritos e perigos ocultos da futura nova licença da licença GPL, o Linux Journal resolveu ir direto à fonte, contatando o líder máximo da FSF e autor da GPLv2, Richard Stallman, e um conjunto dos principais desenvolvedores do kernel Linux, incluindo seu autor original Linus Torvalds, seu fiel escudeiro Andrew Morton, e mais alguns que freqüentemente têm sido vistos expondo opiniões dissonantes - incluindo o defensor ferrenho da proibição dos drivers de código fechado, Greg Kroah-Hartman, e o ponto de vista europeu de Alan "Linus é um péssimo engenheiro" Cox.
As respostas são longas (ao final de cada uma tem o link para a respectiva continuação), e a leitura vale a pena para quem quer entender melhor os pontos de vista envolvidos. Recomendo que você leia a íntegra, mas vou sintetizar abaixo o que mais me chamou a atenção em cada uma das respostas, me restringindo aos trechos que saíram na edição impressa. Não é uma tradução literal, portanto acompanhe pelo texto original.
Richard Stallman: o propósito da GNU GPL é defender para todos os usuários as liberdades que defendem o software livre, e é o resultado da implementação do software livre da maneira mais forte que pudermos. Assim, ela impede qualquer intermediário de acrescentar restrições adicionais. Mas a versão da GPL de 15 anos atrás não lidava com a ameaça de o programa ser tornado menos livre por restrições técnicas ao seu redor, como ocorre no caso da tivoização, em que o código-fonte recompilado não pode ser executado no equipamento original. Assim, decidimos fazer o que for necessário para evitar a tivoização de nosso software.
Linus Torvalds: Não acho que vá haver muitos efeitos práticos, então provavelmente isto nem importa tanto assim. Não é como se não tivéssemos tido discussões de licenças antes, ou como se a divisão entre as mentalidades de software livre e as de código aberto sejam uma novidade introduzida pela GPLv3. Assim, embora ainda haja possibilidade de acordo, não acho que será um desastre se terminarmos tendo uma nova GPLv3 incompatível com a GPLv2 - já convivemos com licenças livres incompatíveis hoje, e os aplicativos das licenças mais diversas rodam tranquilamente no kernel GPLv2. O pior de tudo vai ser a confusão entre duas licenças possivelmente populares e incompatíveis entre si, compartilhando a mesma sigla. De certo modo, espero que a admissão de que pode haver diferenças de opinião acabe com tensões estúpidas, e que a FSF possa até parar de usar o nome GNU/Linux.
Alan Cox: Não existe GNU/Linux. Isto é algo importante de se compreender e esclarecer. Quero dizer que não existe nem mesmo uma entidade abstrata que pssa ser propriamente chamada de "GNU/Linux". É uma campanha da FSF para tentar se associar ao Linux. Normalmente esta é uma das coisas que a FSF faz e as pessoas apenas suspiram, mas quando se olha para o debate sobre licenciamento, esta distinção é vital. O Linux não é um projeto da FSF, a maioria de seus desenvolvedores não crê na orientação política da FSF, e o Linus escolheu originalmente esta licença por acreditar que ela era adequada ao projeto, e não por ser um fã do Manifesto GNU. Assim, a questão não é sobre o pessoal do Linux se separando da FSF - é sobre um projeto separado sendo consultado para saber sua opinião sobre uma nova versão de sua licença, e deixando-a clara. O projeto Linux de fato faz uso das ferramentas GNU, mas isto não o torna um projeto GNU, ou gera a necessidade de prefixar seu nome, mais do que esta minha mensagem não é propriedade da IBM por ter sido escrita em um PC, ou precisa ser prefixada com a sigla BT porque a minha ADSL é da British Telecom.
Greg Kroah-Hartman: A questão que a FSF chama de Tivoização basicamente afeta hoje essencialmente apenas o kernel Linux, pois não há outros kernels populares sob a licença GPL - e a restrição de execução no Tivo e outras similares ocorrem justamente sobre o kernel. Nós desenvolvedores do Linux já temos a nossa própria política com relação à possibilidade de uma BIOS ou firmware determinarem se um determinado kernel pode ou não dar boot. A FSF está incluindo detalhes na GPLv3 que basicamente se aplicam apenas a nós. Como a FSF não contribui com o desenvolvimento do Linux e não tem nada a ver com ele em geral, nós desenvolvedores do kernel não estamos apreciando a forma como ela está lidando com uma questão tão específica e sobre a qual já nos posicionamos.
Andrew Morton: Somos programadores e passamos nosso tempo programando, e não pavoneando em reuniões sobre questões legais e jogos políticos. Assim muitos de nós simplesmente ignoraram a questão, até que percebemos aonde estavam querendo chegar, e soubemos das preocupações que surgiam. De fato isso aponta para outro problema: a maioria das pessoas que escreve código não se manifestou, e mesmo assim a FSF presume que fala em nome deles, e usa seu trabalho como munição nas campanhas dela. E por que esses programadores não falam? Alguns estão ocupados. Outros trabalham para empresas com excesso de advogados que têm medo de que as opiniões deles possam ser vistas como sendo da empresa. Alguns não falam inglês muito bem. E todos acham o tema tedioso e uma distração.
Dave Miller: Para o kernel, acredito que as coisas continuarão indo como sempre foram. Os problemas estão basicamente nos projetos sob o guarda-chuva do projeto GNU, como o gcc e binutils. O copyright deles pertence à FSF, que quase certamente irá relicenciá-los sob a GPLv3. No momento em que a FSF relicenciá-los, ficaremos sabendo o que seus desenvolvedores acham do assunto - eles continuarão desenvolvendo como se nada tivesse acontecido (mas agora sob a GPLv3), ou simplesmente criarão forks GPLv2 (este ou não é exclusivo). A FSF pode definir o licenciamento dos projetos cujo copyright pertence a ela quanto ela quiser, mas são os desenvolvedores que decidem o que acontecerá, em última análise: quando o pessoal político faz alguma bobagem, os desenvolvedores livres sempre podem levar seu conhecimento (e o código completo) para outro lugar. Eu sei disso na prática, pois fiz parte do grupo que criou o fork do GCC e retirou-o do domínio do projeto GNU no passado, por discordar da orientação que estava sendo dada. Richard Stallman não gostou nem um pouco, mas não podia fazer nada para impedir. E mais tarde, foi o nosso fork que foi adotado como o "GCC oficial" pela própria FSF. Mas a questão ainda está fechada, então a FSF ainda tem tempo de consertar as pontas soltas.
Mas não se baseie na minha interpretação - leia o artigo original!”
E sim, eu conheço aquele bla-bla-bla de porque deveria ser GNU/Linux, mas francamente isto não passa de guerra de egos.
Linux é um nome que soa bem, não estraguem o nome. De qualquer forma quem usa Linux sempre descobrirá o que é liberdade e o que é a fundação GNU.