Uma série de leitores tem enviado links sobre a onda de censura que parece estar se abatendo sobre o Brasil, e especialmente no judiciário paulista, no que diz respeito a bloquear acesso a sites com base no conteúdo que exibem.
O BR-Linux ocasionalmente recebe solicitações de remoção de conteúdo, que trato com a maior atenção, sempre com base nos
termos de uso do site. Ainda não ocorreu de haver medida judicial neste sentido por aqui, embora comunicações de advogados sejam comuns (e usualmente desnecessariamente exageradas), e o diálogo sempre foi suficiente para resolver todas as questões (se o seu site ainda não publica seus próprios termos de uso, recomendo passar a fazê-lo urgentemente, e sinta-se à vontade para se basear nos do BR-Linux).
E na manhã de hoje gastei algum tempo prestando assessoria extra-jurídica a um colega mantenedor de outro blog, que estava sendo ameaçado por uma pessoa mencionada em uma notícia dele, reproduzida de outra publicada na imprensa, e relacionada a um vídeo "íntimo" distribuído pela própria parte interessada, e que causou sua demissão de uma rede de TV nacional. Acredito que ele chegou a uma boa solução, bem mais interessante do que uma contenda jurídica, mas não vou revelar os detalhes ou links para não prejudicar ninguém - peço que ninguém publique nos comentários também.
Inquisição espanhola
A responsável editorial pela revista Info publicou em seu blog individual
uma peça bastante ferina e irônica sobre a recente
decisão do judiciário paulista de proibir comunidades anti-Rubens Barrichelo no site de relacionamentos Orkut. Trecho da manifestação irônica da Sandra Carvalho: "Uma internet totalmente gentil, só com opiniões a favor, é muito melhor do uma web caótica e democrática, onde cada um pode dizer o que pensa, evidentemente. Como não pensamos nisso antes? Vamos reconhecer: de que serviram, até hoje, as gozações com o Rubinho Barrichello? Só denegriram o talento nacional, é claro. Agora que o Tribunal esclareceu que no Orkut só podem florescer as comunidades a favor, tá tudo dominado, e em paz. Não está? Prêmio Nobel, pls."
Como o cidadão pode reagir?
Está claro que até o momento não houve ordem judicial de censura diretamente ao cidadão. No caso Cicarelli, o desembargador ordenou aos provedores de acesso internacional que exercessem medida técnica de bloqueio, e neste caso do Barrichelo, a ordem é para os administradores do Orkut, para que removam as comunidades que criticam o piloto.
Nestes casos, a forma de ação básica e legítima do cidadão indignado com a restrição pode passar por 3 métodos, desde que não cometa ilegalidades incidentais (como por exemplo praticar calúnia, injúria ou difamação, ou infringir o direito de imagem ou direitos autorais de alguém) ao praticá-los:
Método 1: encontrar formas alternativas de acessar os sites bloqueados, e ajudar a divulgá-las. A ordem judicial para que os provedores tomem medidas técnicas não torna ilegais os acessos pelos cidadãos, embora os provedores citados possam passar a ter a obrigação de impedir todos estes acessos alternativos também. No caso Cicarelli eles não tinham, pois a ordem judicial definia expressamente quais as medidas técnicas que deveriam ser tomadas. Mas será que eles conseguiriam bloquear todas as alternativas?
Método 2: Usar locais e formas alternativas, que não tenham sido vedadas, para exercer o direito de livre expressão. Não tenho dúvida de que Rubens Barrichelo irá ganhar uma legião de novos interessados em criticá-lo, com a divulgação da notícia de que ele solicitou (e obteve) censura a quem o fez anteriormente. E estes interessados encontrarão onde se expressar. Da mesma forma, a imprensa noticiou que sábado acontecerá até mesmo um
protesto em frente à sede da MTV contra a sua apresentadora tão em evidência nos últimos dias.
Método 3: Votando com a carteira e a consciência. Não sou fã de boicotes, mas tenho pouca dúvida de que os impetrantes destas ações de censura não vão ser chamados para muitas ações de marketing ou comunicação no futuro próximo - e se forem, não será com os mesmos resultados que obtinham antes.
Aspectos legais e jurídicos
O melhor a fazer, quando há dúvidas a este respeito, é consultar um advogado. Eu não sou um deles, portanto não tome nada do que leu aqui como conselho legal.
Mas lembre-se de que vivemos em um estado de direito, que é livre a manifestação do pensamento (vedado o anonimato), e que não se pode ser proibido de fazer algo sem amparo legal.
Lembre-se também de que calúnia, injúria e difamação são crimes mesmo quando a pessoa tiver provocado a sua reação, e que publicar vídeos sempre pode infringir os direitos autorais e de imagem de alguém envolvido.
Para saber mais da minha opinião sobe a legalidade de burlar o recente bloqueio do YouTube, leia
meu texto de sábado passado. Se o assunto lhe interessar, veja também
a análise do Glaydson Lima.
Quanto a respostas jurídicas à censura já ocorrida, acredito que não tardaremos a vê-las surgir - seja contra os impetrantes ou contra as concessionárias.
Num país em que no mesmo semestre a justiça manda desativar sites por fazerem críticas a personalidades, censura previamente a publicação de um livro devido à manifestação de uma celebridade nele analisada, e bloqueia acesso a um serviço útil porque ele inclui vídeos de uma modelo fazendo em público algo que ela preferia não ver divulgado, é de se perguntar qual o próximo passo: apreender e queimar livros em praça pública? Legalizar a tortura em nome do bem comum? De que outras liberdades esperam que o brasileiro abra mão?
Para fechar, lembre-se novamente: a Internet foi projetada para resistir a um ataque nuclear, e tende a rotear ao redor de tentativas de censura e bloqueio - ainda mais em casos como este, em que o próprio magistrado que proferiu a sentença tinha tão pouca certeza do que estava determinando, que no mesmo dia "confirmou" para a imprensa - em desacordo com os autos - que o bloqueio completo nunca foi determinado.
Cabe a nós combatermos isso mostrando a outras pessoas como furar os bloqueios e protestando contra qualquer tipo de violação a liberdade de expressão.
Ou senão acabaremos como um grande rebanho de ovelhinhas...