Esta semana o editorial trata de diversos fatos relevantes ocorridos nos últimos 7 dias, dos quais o mais relevante é sem dúvida a liberação (fruto de uma omissão) da comercialização de micros com dual boot com os benefícios do Computador para Todos.
Leia o editorial completo.
Vírus e malware no Linux
Vírus, cavalos de tróia, keyloggers e outros códigos maliciosos são fatos da vida. Há exemplos de keyloggers e cavalos de tróia bem-sucedidos em ambiente Linux, e cedo ou tarde acabaremos encontrando algum vírus bem-sucedido também, embora as condições para o funcionamento deste tipo de código no Linux não sejam muito fáceis.
Uma das notícias mais lidas da semana foi a
resposta do OpenOffice.org às notícias sobre um vírus de macro que afetaria o sistema - mais um carnaval na imprensa especializada (ou nem tanto) sobre um vírus prova-de-conceito (criado e disseminado apenas em laboratório) que não explora nenhuma falha do sistema, mas sim características inerentes de qualquer sistema de macros - e contra o qual o OOo já tem mecanismos de defesa e alerta implementados.
A imprensa está fazendo seu papel, mas é o segundo "ataque" neste estilo em poucos meses, seguindo de perto o recente caso do
"vírus multiplataforma", que também não explorava nenhuma falha do sistema mas foi anunciado com trombetas como se fosse a prova definitiva de ausência de segurança no código aberto.
Nem tanto ao mar nem tanto à terra, dizem os sensatos. Um código malicioso não precisa explorar falhas do sistema para ser perigoso. Qualquer sistema operacional ou aplicativo que permita a escrita sobre seus arquivos ou registros por parte de programas de terceiros está sujeito a ser alvo de cavalos de tróia, e cabe aos administradores e usuários se precaver. Mas, como levanta o recente artigo
Can the malware industry be trusted?, estamos assistindo a uma onda de notícias que geram no público a impressão de que os sistemas não-Windows (como o Linux e o Mac OS X, alvo de recente "ataque" do SANS) são tão alvo de vírus quanto o próprio Windows - a partir de fatos que não demonstram isso, mas apenas que também é possível construir códigos maliciosos nestas plataformas.
Além de criar proteções contra estes códigos, devemos sempre ter em mente que o ataque sendo praticado aí pode ir bem além do efeito dos cavalos de tróia. E cabe a mesma pergunta do artigo citado acima: a que empresas interessa a perpetuação da dominância de um sistema para o qual há abundância de vírus e a clara necessidade de aquisição de software anti-vírus comerciais? E de que empresas partem estes estudos que abastecem a imprensa com notícias sensacionais sobre ataques a outros sistemas operacionais?
Você já doou para a FSFLA?
A FSFLA é uma organização não-governamental sem fins lucrativos, fundada em 23 de novembro de 2005, sediada em Buenos Aires, Argentina. Seu objetivo é promover e defender o uso e desenvolvimento de Software Livre, e o direito das pessoas de usar, estudar, copiar, modificar e redistribuir software.
A FSFLA busca agora estabelecer-se juridicamente, algo que demanda muito esforço, e também recursos financeiros parte dos quais teriam sido obtidos pela cobrança pela concessão de autógrafos e fotografias de Richard Stallman no FISL, a julgar pelas declarações do próprio. Logo após o FISL, entrei em contato com Richard Stallman, fundador da FSF, e com Alexandre Oliva, secretário da FSFLA, sugerindo a eles que criassem uma forma de que interessados em contribuir financeiramente com a causa pudessem fazer doações em reais.
Eles atenderam à minha sugestão, e recentemente pude fazer minha própria doação, e publicar o
guia de como doar em reais para a FSFLA. Espero que boa parte dos que se interessam em defender a FSFLA com palavras também tenham interesse em fazê-lo com a carteira!
Dual boot no Computador para Todos: ô pissít!
Esta semana tivemos mais uma cena que poderia ser digna dos grandes campeões de audiência do cinema brasileiro, protagonizada por uma série de personagens envolvidos na política de software livre do governo brasileiro cada um com seu próprio script, e até o momento culminando em um final triste: o financiamento especial governamental idealizado para beneficiar a venda de computadores populares rodando software livre passou a ser dado, aparentemente contra a vontade dos autores da norma, a máquinas vendidas com Windows XP e Linux em dual boot.
Não sou contra o benefício ser dado a qualquer equipamento que reduza o abismo digital da população, seja ele rodando Windows, Mac OS ou CP/M. Mas ver isto acontecer devido a uma norma insuficientemente depurada, contra a vontade de quem legislou, e com o agravante de o assunto ter sido levado ao conhecimento dos responsáveis em fevereiro, e mesmo assim não ter sido revertido, é uma cena digna até mesmo de comiseração.
A narração das cenas a seguir, e da descrição acima, é toda proveniente dos palcos do IDG Now e ComputerWorld, que aparentemente têm acesso a fontes privilegiadas no que diz respeito aos bastidores da tecnologia em Brasília.
Sobe o pano, e a história começa em 20 de maio, já com vozes indignadas e outras nem tanto:
Temos informação de que uma das empresas que fabricam os equipamentos do Computador para Todos fez uma consulta ao departamento jurídico do MCT [Ministério da Ciência e Tecnologia] questionando a possibilidade da implantação do dual boot, informa Sérgio Rosa, diretor do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro). Sérgio Amadeu, ex-presidente do ITI e um dos maiores defensores do software livre enquanto atuou no governo federal, alerta para o fato de que não descarta a possibilidade de certos fabricantes tentarem oferecer os equipamentos do programa Computador para Todos com os dois sistemas pelo mesmo preço praticado apenas com Linux.
Na mesma ocasião, fica claro o entendimento de que não há mesmo o veto ao dual boot na norma que foi redigida e aprovada no ano passado, mas que as autoridades responsáveis contavam com a compreensão dos fabricantes para não fazer aquilo que lhes foi permitido:
Cézar Alvarez, assessor especial da Presidência da República e um dos coordenadores da iniciativa, aponta que tema do dual boot foi debatido exaustivamente ao longo de um ano e meio da elaboração do programa e foi descartado por questões de engenharia e suporte. O executivo enfatiza ainda que apesar de ser clara a opção por software livre para os equipamentos que podem ser financiados pelo Banco do Brasil ou Caixa Econômica Federal, o grande problema está na redação do decreto que regulamenta o programa. Não há veto explícito no corpo do decreto, mas achei que as próprias empresas que, em certo momento acompanhavam o debate do dual boot, tivessem compreendido. Mas talvez tenhamos falhado na redação, aponta Alvarez.
Seguem-se 3 semanas de silêncio, e aí o pano volta a subir, com uma trilha sonora de momento de tensão:
PC popular com Windows chega ao mercado brasileiro - Fabricante Epcom Eletrônica coloca à venda nas lojas da rede Magazine Luíza o computador com dual boot ao mesmo preço da máquina só com Linux, contrariando as expectativas dos defensores do código aberto. Surgem novos personagens, uma executiva da Epcom e o presidente do Serpro:
Isso [inclusão dos dois sistemas] não fere a lei. Estamos seguindo 100% das exigências do programa de código aberto e oferecendo ainda mais opções aos clientes, ressalta a executiva.
Não é isso o que diz o diretor do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), Sérgio Rosa. Em entrevista ao COMPUTERWORLD, Rosa garante que fabricantes que insistirem na ação devem ter benefícios fiscais retirados.
O narrador deixa transparecer respostas aos questionamentos anteriores sobre a impossibilidade de vender micros com Windows XP ao mesmo preço praticado para os micros com Linux, e sobre os problemas causados nestes micros devido às quantidades irrisórias de memória (
alguns modelos com o selo do Computador para Todos com Linux tinham apenas 96MB de RAM disponível para o sistema operacional):
A Epcom, no entanto, manteve o mesmo patamar de preço, e atribui a possibilidade à negociação com os diversos fornecedores. Houve um comprometimento de nossos parceiros para todos os itens do que equipamento, de maneira a manter o mesmo preço, diz.
O novo equipamento traz processador Celeron D315, disco rígido de 40 Gigabytes (GB), 256 Megabytes (MB) de memória, gravador de CD e distribuições Linux (Metasys) e Windows Starter Edition. Segundo a executiva, é possível inclusive que, posteriormente, os compradores do novo PC popular façam a atualização inclusive para o Windows XP Home.
O pano deste ato cai em silêncio:
Procurado pela reportagem, o coordenado do programa, Cezar Alvarez, ainda não se posicionou sobre o assunto.
Novo ato: o coordenador do programa, a mesma autoridade governamental que no primeiro ato admitiu a omissão do veto ao dual boot e no segundo ato silenciou, juntou-se ao coral de vozes que dizem ser irregular o dual boot, enquanto o Ministério da Ciência e Tecnologia mantém seu ponto de vista inicial de que o dual boot não fere a norma estabelecida:
Na avaliação de Sérgio Rosa [presidente do SERPRO], o fabricante que incorporar o sistema de código aberto poderá perder inclusive os incentivos fiscais previstos em lei.
Disputas entre fabricantes à parte, toda a discussão sobre o tema expõe ainda vulnerabilidades de interpretação dentro do próprio governo federal. Ao passo em que o próprio Cezar Alvarez, assessor especial da Presidência da República e coordenador do programa, e outros integrantes do governo sustentam a posição de que a portaria é clara e determina o uso do software livre, o departamento jurídico do MCT continua ressaltando que o uso de dual boot não representa infrações quando recebe consultas de fabricantes.
Enquanto isso, desde o dia 7 de junho as máquinas com dual boot da Epcom vêm sendo vendidas com o mesmo incentivo. E em uma gigantesca coincidência, na mesma semana a Positivo divulgou uma pesquisa dizendo que
75% dos compradores de computadores populares com Linux instalam Windows neles em 3 meses. Excelente
timing!
Em paralelo, na mesma semana, outro ramo do envolvimento do governo com software livre chegou a um
desenlace: as últimas versões do Freedows e do Free Office, projetos que envolviam a Cobra e a empresa Free Software, foram disponibilizadas para download gratuito, embora ainda com a mesma licença não-livre de sempre. As versões foram lançadas em 2005.
Volto a repetir que não vejo nada de errado em incentivo à comercialização de quaisquer tipos de computadores que possam ajudar a reduzir o abismo digital no Brasil. Mas este tipo de desentendimento entre setores de uma mesma organização, ausência de cuidados básicos na redação da norma, e a divulgação de que o pedido da Epcon foi feito em fevereiro, e só agora vai haver alguma movimentação no sentido de tentar mudar a norma omissa, certamente me fazem refletir.
Onde estão os articuladores políticos da comunidade? - Parte III
Sempre otimista, como no caso da revista Veja, passei a semana esperando o surgimento de uma resposta organizada a esta questão do dual boot, por parte dos segmentos mais politizados de nossa comunidade. Um contato, um convite, um pedido de divulgação, qualquer coisa. Mas o chamado não veio, a chama não foi acesa.
Ontem resolvi sair em busca de movimento em outros setores, para poder me integrar e ajudar a noticiar e somar esforços. Comecei pelo site do PSL-Brasil, sempre tão combativo e transparente, e provavelmente o principal ponto de contato entre governo e comunidade além de contar com o privilégio da articulação de diversos grupos estaduais, regionais e especializados, como o PSL-Jurídico. Mas aparentemente o assunto nem mesmo foi noticiado por lá.
Pesquisei a opinião da FSFLA, e descobri que seu Secretário compartilha da opinião do presidente do SERPRO de que a inclusão de dual-boot viola a norma existente. Não descobri nenhuma ação organizada por parte dela que eu pudesse apoiar ou noticiar neste momento, entretanto.
Procurei ainda manifestações de outras pessoas que no passado haviam chamado para si o papel de articuladores, mas os que eu pesquisei estão fora do Brasil e envolvidos em outras atividades, aparentemente sem interesse no que acontece na cena política nacional relacionada ao software livre.
Sendo assim, lanço a pergunta: há algum movimento em andamento para buscar explicações e tentar corrigir esta grave omissão na norma, ou exigir o seu cumprimento (caso a omissão não seja real)? Como posso apoiar esta iniciativa? Nosso movimento conta com algum tipo de articulação política hoje, ou é melhor eu desistir de procurar?
Os executivos e os números falam
Esta semana tivemos várias manifestações interessantes que merecem atenção. Embora executivos não sejam sempre boas fontes de informações técnicas, eles em geral dão boas idéias sobre direções e intenções. Assim, recomendo a leitura das notícias sobre os pronunciamentos abaixo, todos relacionados ao Linux ou ao código aberto:
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Pesquisa Evans Data - comparando o número de desenvolvedores para Linux e para Windows.
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Rogério Santanna (SLTI), sobre governo brasileiro e software livre.
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Bill Hilf, da Microsoft, sobre sua vinda ao Brasil e conversa com Brod, Helio Castro e Maddog.
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Matt Szulik (Red Hat) - Sobre Fedora, Solaris, patentes e mais.
Ubuntu Dapper
Eu instalei o recém-lançado Ubuntu 6.06 Dapper Drake e
gostei. Recomendo que todos os interessados testem!
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Acredito no potencial e boa vontade dos articuladores.gov.
O problema é que o governo brasileiro está muito a frente nas questoes referentes a SL, devemos focar em outras frentes. O governo realizou um trabalho excelente e inedito nos ultimos 3 anos. Estas pessoas não podem dispensar tempo e capacidade técnica fazendo militancia em paises como a guatemala, colombia ou paraguay... O que atrai atenção mesmo são os projetos de alta responsabilidade na espanha e suica. Voce deve entender que a base do SL como militancia é exatamente essa: a colaboracao e globalizacao do conhecimento.